quarta-feira, 23 de abril de 2014

MARCO CIVIL DA INTERNET



 ANNA PAULSEN
Associada do Batista Advogados

O plenário do Senado Federal aprovou nesta terça-feira (22.04.2014) o projeto de lei que institui o Marco Civil da Internet. Assim que for publicado, o projeto irá para sanção da presidente da República, Dilma Rousseff.

O referido Projeto de Lei estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil e determina as diretrizes para atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação à matéria. Trata-se basicamente de uma Constituição a respeito do uso internet, tema não regulamentado de forma ampla até a presente data.

Em termos iniciais, o Marco Civil da Internet estabelece os fundamentos, princípios e objetivos da disciplina do uso da internet apontando, entre eles, a liberdade de expressão, direitos humanos, livre iniciativa, livre concorrência, proteção da privacidade e dados pessoais, preservação da neutralidade da rede, estabilidade, segurança, acesso à informação, entre outros.

Por parte do referido dispositivo normativo reforça-se a ideia de que o acesso à internet constitui direito essencial ao exercício da cidadania, sendo previsto como garantia do usuário à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, do sigilo de fluxo de suas comunicações pela Internet, de suas comunicações privadas, à não suspensão da conexão da internet, salvo por débito, manutenção da qualidade contratada, à informações claras e completas constantes nos contratos de prestação de serviço, não fornecimento de seus dados pessoais à terceiros, necessidade de consentimento expresso sobre a coleta, uso e armazenamento de dados pessoais etc.

Trata-se de grande avanço pro consumidor na medida em que, diuturnamente, o mesmo depara-se com a contratação de um serviço de dados que muitas vezes não atende a velocidade contratada, evidenciando especial proteção aos dados pessoais e necessidade de autorização expressa para utilização dos mesmos.

Conforme redação aprovada, podemos verificar que o Marco Civil da Internet possui 03 fundamentos principais: Neutralidade, Privacidade e Liberdade de Expressão.

Em relação à neutralidade, o Marco Civil da Internet dispõe que deve haver tratamento isonômico dos pacotes de dados contratados por parte do usuário. Ou seja, os diversos provedores de internet não poderão oferecer conexões diferenciadas, por exemplo, para acesso somente a e-mails, vídeos ou redes sociais. A internet será ofertada independentemente do conteúdo acessado pelo usuário.

Alguns críticos da neutralidade dizem que diante do exposto acima a liberdade dos provedores de internet encontra-se restringida, pois impede que os mesmos forneçam serviços diferenciados de acordo com o perfil do cliente, fato que poderia encarecer o serviço geral a ser ofertado à todos.

Aponta-se que a neutralidade não deve ser confundida com a disponibilização de diferentes velocidades de dados, que continua a ser autorizada pelo Marco Civil, podendo os provedores oferecer pacotes de acordo com a velocidade pretendida pelo usuário.

Qualquer discriminação ou degradação do pacote de dados somente será admitido por meio de decreto presidencial e observados dois requisitos: "priorização a serviços de emergência" e "requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços e aplicações".

Em relação à privacidade estabelecida por parte do Marco Civil verifica-se pelos dispositivos trazidos em seu corpo que há principal preocupação na proteção dos dados pessoais dos usuários, apontando que os referidos dados pessoais, assim como comunicações privadas (e-mail, Skype, Facebook, MSN etc.) somente podem ser disponibilizados pelo provedor caso haja ordem judicial.

É previsto também que as empresas só poderão utilizar os dados para o propósito pelo qual foram coletados. Assim, as empresas coletoras de dados se obrigam a deixar evidenciado de forma expressa e clara a finalidade da coleta dos dados. Caso os dados sejam utilizados de forma diferente do acordado entre as partes é clara a possibilidade de indenização ao consumidor.


Aponta-se que os dados pessoais como qualificação, filiação e endereço poderão somente ser utilizados pelas autoridades administrativas que detenham competência para solicitar tais dados.

Mudança muito boa trazida pelo Marco Civil da Internet é ainda, a previsão de aplicação da legislação brasileira e das disposições contidas na mesma à empresas, responsáveis pela coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, sediadas no exterior, desde que prestem serviço ao público brasileiro.

Essa obrigação impede, por exemplo, como vem acontecendo atualmente, a negativa de empresa no fornecimento de dados, sob alegação de que os mesmos se encontram em arquivos no estrangeiro. Assim, resta claro também que sites como o Facebook que possuem sede no exterior não poderão se escusar de cumprir ordens judiciais.

Por fim, o Marco Civil da Internet dispõe acerca da Liberdade de Expressão evitando qualquer tipo de censura.

De acordo com o art. 18 o provedor de conexão não poderá mais ser responsabilizado por danos decorrentes do conteúdo gerado por terceiros. Ou seja, haverá responsabilização apenas daquele que veiculou o conteúdo. A responsabilidade do provedor somente passará a existir caso este, por ordem judicial, seja determinado à retirar o conteúdo e não o faça (art. 19).

O art. 21 previu ainda que em caso de conteúdos gerados por terceiros, sem autorização de seus participantes, que envolvam cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado o participante poderá notificar o provedor para retirada imediata do conteúdo.

A notificação deverá conter informações específicas acerca do conteúdo que o usuário pretende retirar e demonstrar a legitimidade para formulação do referido pedido, ou seja, demonstrar claramente que se trata de participante do conteúdo divulgado e que não houve autorização para tanto. Recebida a notificação e não retirado o conteúdo do ar a nova legislação prevê a responsabilização do provedor.

Trata-se de grande avanço para os casos de vingança digital nas quais são vazados conteúdos de nudez ou sexuais, podendo a pessoa afetada solicitar a remoção imediata por parte do provedor por simples notificação, sem necessidade de ajuizar, em primeiro momento, uma ação judicial. Desde que, é claro, cumpra os requisitos acima destacados.

Estabeleceu-se, ainda, a possibilidade de requisição judicial ao provedor responsável pela guarda o fornecimento de registros de conexão ou de registros de acesso à aplicações da internet para a coleta de informações necessárias ao ajuizamento de uma demanda penal ou cível.

Ou seja, possibilita-se que haja determinação judicial para verificação e informação acerca do responsável pela veiculação indevida do conteúdo, possibilitando o ajuizamento de demandas por parte do usuário afetado. Uma vez recebidas as informações caberá ao juiz da ação proceder à proteção do sigilo das informações, podendo determinar segredo de justiça nos autos. Temos aqui, mais uma vez, artigo que visa especial proteção à intimidade do usuário, de qualquer lado que esteja.

Temos, diante de todo o exposto, um grande avanço na regulamentação do uso da internet em nosso país, regulamentação esta que busca acima de tudo proteção especial à privacidade de todos os usuários, direito fundamental amplamente violado na atualidade pelo meio digital, sem que houvesse proteção específica acerca do assunto.

 


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